terça-feira, 9 de janeiro de 2018

Cindy

         







A querida Cindy vai fazer 15 anos. Ela nasceu em nossa casa filha de Dolf, um mestiço de dálmata que o Juninho, encontrou no rio, sujo e ferido. Entrou na sala, deitou no canto e deu trabalho para sair. Depois que tomou banho vimos às marcas das feridas longitudinais no dorso. E Dara uma vira lata que latiu no portão, S e M a deixaram entrar, eles abriram e ela entrou, simples assim, deram comida cheios de compaixão e  ela se achegou a casa.     
Dolf tinha sarna crônica e Dara era alérgica a grama. Dessa união nasceram 7 cachorrinhos lindos e amáveis, entre eles Cindy, também alérgica a grama. A minha mãe a queria para levar para o interior, e como não levou, ficou conosco. Sempre alegre e delicada, ainda que rosnasse para Dara quando estava na puberdade, talvez as cadelas também tenham seu tempo de afirmação no mundo, se sentirem alfas.
Os machos permanecem mais tempo se impondo uns aos outros, mas as fêmeas vão se apaziguando. Cindy pariu uma única vez sete lindos filhotes e sempre foi delicada e feliz. Depois vasectomizamos os machos. O maridinho achava que eles deviam continuar tendo orgasmo, o que não aconselho, pois continuam dando muito trabalho e se for um vira lata danado, ele cava o chão por baixo da cerca e vai atrás do cheiro.
Agora a nossa Cindy, que já perdeu as mamas e útero contaminados com nódulos malignos, está idosa e cega, ouve pouco e sempre requisitando uma ajuda especialmente no meio da noite. Em 2010, depois da última cirurgia de retirada de um enorme tumor. Decidi que ela deveria comer comida, passei a cozinhar, carne moída com verduras e arroz integral, parece que isso ajudou pois os nódulos que existiam nas costas diminuíram de tamanho hoje parecem pequenas verrugas, a tal alergia a grama desapareceu, seu  pelo está bonito e desde então ela não fez mais cirurgias. Obs: O arroz integral pode ser trocado por arroz parboilizado dependendo de como o intestino do animal funciona. 
A velhice é uma fase difícil não só para os humanos. Para os animais parece ser trágica, pois alguns de nós os expulsa de casa deixando-os ao desabrigo, numa amargura de ver-se só na rua sem saber o que aconteceu com a sua vida.
A cegueira torna difícil a locomoção, especialmente numa casa que tem um grande jardim e ela está sempre trombando em plantas paredes e portas, o que faz com que os olhos pareçam estar inflamados.  Hoje vi o quanto é difícil para um animal cego á mudança de hábito. Ela sabe onde está a água, onde fica a comida e onde fazer xixi, onde está a comida dos outros cachorros. Com dificuldade dos membros endurecidos, nem sempre ela consegue sair de casa a tempo de chegar ao jardim, e assim mudei  sua almofada  de lugar, já não fica na sala e sim na área de serviço pois é mais perto da porta, assim essa parte da casa tem cheiro de xixi de cachorro, limpamos mas sempre fica um cheirinho, não importa, ela é prioridade e eu tenho de cuidar muito bem.          
A comida de Hollyfield, o gato, é um caso especial, dá pra ver que Cindy não ouve quase nada, mas consegue ouvir os grãozinhos de ração caindo na vasilha, portanto é comum cinco minutos depois que se coloca a comida de Holly ela se levanta e vai atrás. Talvez seja um som diferente e ela pode captar.
O que é se faz quando sua cachorra faz cocô naturalmente na almofada onde está dormindo? E continua dormindo. Afasto-a delicadamente, pego o tapete que coloco em cima da almofada e levo para o sanitário, como é um cocô sadio se solta fácil caindo no vaso, dou descarga e levo o tapete para o jardim pois tenho de lavá-lo no outro dia, coloco fralda nela que volta a dormir. Ela merece.     
Me toca o coração quando vejo sua aflição ao sair de casa e o xixi escorrendo, é claro que me incomodo, não primo por gentileza e compreensão o tempo todo e certas hora me vejo carregando-a rapidinho para o jardim por pura falta de paciência. Mas me coloco sim no seu lugar e imagino como seria eu cega e meio surda sem conseguir captar uma voz que indique referência de direção. Ainda que seja um animal, é um ser vivo vivendo na escuridão e no silêncio fazendo que esteja num mundo aparte numa dependência total de mãos gentis. — Decrépita como todos nós podemos ser um dia.   
Ela passou três dias dormindo na garagem pois o piso de cimento não é liso ela não escorrega ao levantar, mas isso não impediu que eu me levantasse no meio da noite para ver se ela está embrulhada, já que na garagem faz frio. Como essa experiência resultou em almofada molhada, eu a trouxe de novo para dentro de casa, mais uma tentativa dela dormir de fralda.  
E como também acontece conosco – humanos – ela trocou o dia pela noite e assim das 23;30 hs. ela está sempre me requisitando, seja para fazer xixi em que tenho de levá-la mesmo de fralda para fazer xixi, ela faz na fralda e continua de fralda e levo-a de volta para a almofada, e assim uma hora depois. Já aconteceu de eu levantar 12 vezes numa só noite, e realmente é um incomodo muito grande quando se perde o sono, especialmente porque não consigo dormir de dia. É claro que me irrito. Mas depois penso, será que é uma prova de vida? Esse pensamento ajuda racionalizar o momento, mas depois de um ano de farra noturna hoje em dia, depois do primeiro xixi, se ela requisita eu espero ela chamar pela décima vez, o que significa que ela se afastou da almofada, tirou a fralda e fez pipi no chão, e está reclamando para que a tire do chão frio. E assim mais uma vez levanto e vou limpar, e arrumar ela de novo na almofada deixá-la quentinha, quem sabe assim ela me deixa dormir mais um pouco?        
Agora, por mais trabalho que dê, acho uma falta completa de noção, quando alguém dá a sugestão para que pratiquemos eutanásia em um animal cria da nossa casa, para que eles não sofram.
Ela só está idosa, ela come bem, não está doente nem sente dores, ela dorme o tempo todo, aliás ela sempre gostou de dormir.
Será que no dia em que estiver idosa, meus filhos vão mandar fazer eutanásia de mim? Espero não viver para ver isso.

                                                       2 de setembro de 2016 


P.S. A querida Cindy foi embora dormindo suavemente no dia 3 de  maio de 2017.  

Um comentário:

  1. Que relato mais lindo de um amor incondicional por sua cachorrinha. Certamente na tua velhice haverá de encontrar alguém que te dê o mesmo amor e cuidados. Deus proverá!

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