Depois da
festa
Três horas da
manhã.
A casa estava vazia silenciosa.
Sentada
numa poltrona da sala, ela não tinha sono. O marido e os filhos já dormiam há
algum tempo. Digerindo a labuta da festa, Márcia olhava para o chão e via papeis de doces espalhados, cadeiras fora do
lugar, as almofadas do sofá estavam completamente reviradas como se tivessem procurado alguma
coisa, o que? Ela não sabia, outro sofá estava molhado de xixi cujo cheiro
emanava pela sala.
Em cima de uma mesinha copos espalhados, alguns virados misturando
cerveja com pedaços de croquete de
galinha afrontavam o tampo que
envernizara com tanto zelo. Alguém
perdera um cinto de cetim que se encontrava deslocado em meio a papelada que
jazia no chão. Ela olhava procurando encontrar alguma coisa que lhe desse o
conforto de paz, da ordem. Na mesa de
jantar, a toalha de labirinto que a mãe lhe dera, parecia protestar com a
violência de sujeira a que fora submetida,
pedaços e farelos de doces e salgadinhos misturados com as frutas que enfeitavam
o presunto, contrastavam com o róseo ponche esparramado sobre o branco total da
toalha. Estranho! Por que em cima da mesa a poncheira continuava praticamente
cheia de ponche que, mesmo parecendo que ninguém tinha mexido, apesar de
derramado sobre a mesa a aparência que era de um rosa quase vermelho
translúcido estava agora com um tom rosa pálido, leitoso?
O tapete também tinha sido castigado, e, de longe dava pra ver o brilho
de grãos de açúcar colorido que o deixava peguento, pedaços de brigadeiros pareciam chicletes grudados nos pelos do
tapete. Ela nem queria pensar no estado do jardim, pois a última vez em que lá
estivera, vira copos plásticos desfiados e guardanapos de papel esfarrapados
amontoados no gramado parecendo que houvera
uma batalha que não era de cachorros nem de formigas.
Era-lhe tão triste pensar que aquela era uma festa que programara para o
filho tanto tempo antes, e só convidara parentes e amigos, todos tão educados.
E ela passara dias preparando os acepipes com tanto zelo, ver agora que do
trabalho de dias restara aquela confusão espalhada pela casa. O sanitário! Esse iria deixar para a manhã seguinte, pois
não valia a pena sequer pensar no assunto, é considerado normal sanitário de
casa depois de uma festa parecer sanitário público em época de carnaval.
Estava cansada do dia, estava cansada só de pensar que deveria se
levantar e sair limpando tudo para que o amanhã não fosse tão fatigante. Quando, seu olhar, deparou com uma mesinha no
canto da sala, que, permaneceu intacta. Nela, um pequeno jarro com flores naturais, repousava tranquilo em meio à desordem,
ninguém havia tocado ali. Na realidade não era propriamente um jarro, era um frágil
cálice comprido de cristal, onde colocara algumas flores do seu jardim, e lá
estava ele altivo e fresco como a dizer:
— Está vendo! Não são tão horrorosos assim, me
deixaram inteiro.
Aí então, ela se levantou e andou em direção à mesa.
Depois, ia dormir tranquila.
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